Foto ilustrativa

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quarta-feira, 30 de março de 2011

Série Especial: Consciência de Viver-Capítulo 6

Capítulo 6


Ele estremeceu. Sua cabeça rodava furiosamente e não percebeu que caíra ao chão frio e imundo, levantando uma nuvem de poeira negra e gordurosa. Mas naquele ambiente tão insuportavelmente tépido,a "frescura" daquele piso lhe era agradável e reconfortante. Até ele abrir os olhos e olhar para cima.
 Lá estava o esqueleto de cavalo outra vez. Ele estava absolutamente paralisado em pânico. E o monstro sorria do modo sinistro e infame como só as caveiras o fazem. Quem sabe por isso são tão assustadoras?
Mas o monstro estava calmo. Virou-se de costas e caminhou tranqüilamente pela casa. Desta vez, porém, seus passos eram silenciosos, e Ele não ouviu mais nada. Que crueldade! Agora Ele não poderia mais andar sossegado pelos corredores e seria obrigado a descobrir onde o Espectro estava. Poderia estar escondido em qualquer lugar. E assustá-lo terrivelmente. Pior, o esqueleto não dependia mais do livro para aparecer e podia dar sinal de vida ou desaparecer quando muito bem o entendesse. Ele estava nas mãos dele.
O tal fantasma passou a dominá-lo completamente e podia fazer dele o que quisesse ao seu bel prazer.
Prazer! Um tenebroso prazer parecia ser o que sentia, o verdadeiro significado daquele sorriso ossudo e maligno do Espectro. Sadismo sempre foi uma característica intrínseca de quem é realmente perverso. O mal que exprime sua crueldade de uma maneira simples e aterradora, o prolongamento da dor, mas também com a angústia muito mais profunda da expectativa mais longa, aquela que pode acontecer a qualquer momento e não acontece. O mal sugerido, escondido, o que não aparece – este é o que mais nos assusta e o que dá um prazer sôfrego e estimulante a quem nos infere sofrimento.
E Ele se exasperava, chorando a soluços. Teria de enfrentar seu algoz... mas, e coragem? E coragem para isso? Como não notar que, se estivermos sós no escuro, o medo que nos apavora aumenta geometricamente quando temos consciência de que ele esta aí, mas não o detectamos a cada ligeiro ruído que ouvimos? Sim, porque a cada detalhe mais ínfimo esta imaginação dominante aumentará mais e mais o Monstro que tememos, e quanto mais nos amedrontamos, mais ele aumenta!
E era exatamente o que acontecia com Ele. Pior, ele tinha um limiar muito alto, muito mais do que o normal de suportar o terror. Ninguém se assustava tanto e tão bem quanto Ele!
E Ele estava ali no chão da cozinha, aderente como cola. Passou horas assim. E o Espectro, para ele, parecia não parar mais de aumentar de tamanho em sua imaginação.
Foi então que o esqueleto colocou sua caveira para dentro da cozinha, como quem pergunta se sua vítima não vem. E lá adentrou.
Ele notou, então, que o tamanho real, natural do Espectro era muito mais tétrico do que o imaginara. Maior parecia mais distante. Novamente o cavalo empinado saiu pela casa. Ele estava deitado em posição fetal, seus olhos injetados mostravam um olhar próximo ao do colapso cerebral.
Não conseguia tomar decisões. Sua confusão mental era tamanha que Ele se debatia sem conseguir coordenar pensamentos lógicos. Sua enxaqueca tomava proporções alarmantes, e seu corpo puído não conseguia se mexer, tal a sensação de peso; seu crânio parecia pesar uma tonelada!
No entanto, o aconchego da poeira gordurosa insistia em cobri-lo como um cobertor, e a sensação de conforto aos poucos foi aumentando, e acabou dormindo.
Quando acordou, tinha se esquecido do Monstro. Esfomeado, encontrou no velho armário um grande pote de vidro fosco contendo um tipo de doce que, de tão estragado, estava absolutamente irreconhecível. Mas Ele parecia ter estômago de aço e, para variar, adorou o tal do doce. E dele se serviu à vontade. Saciada a fome, Ele voltou ao seu quarto. Deitou-se, mas não conseguiu mais dormir. Pela escuridão adivinhou que a noite finalmente tinha chegado. Foi aí que se lembrou do quanto odiava a insônia. Lembranças de um sem número de noites tenebrosamente mal dormidas lhe percorriam a cabeça. E novamente a insegurança lhe bateu n'alma.
Seus ouvidos estavam apurados. Lá fora alguma coisa estava acontecendo: Ping, ping, ping...
Ele sabia bem o que era esse barulhinho. Principalmente quando acelerava: ping, ping, ping, ping, ping...
Chuva. Oh, não,de novo não!
(Por continuar)

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