Foto ilustrativa

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sexta-feira, 8 de abril de 2011

Série Especial: Autômato- Capítulo 2

 

 

Capítulo Dois

 

 

 

Não lhe interessava o que lhe era ignorado. Mas aquela imposição pesada e sufocante (?) estava lá ,apertando-o com violência literalmente esmagadora.
Mas a casca de Auto era forte, tão robusta quanto a sua alienação. Quanto mais a mão gigantesca se contraia, maior sua abstração. Tornava-se evidente que sua casca se enrijecia mais e mais ‘a medida que se abstraia.
Auto foi chacoalhado com fúria pelo Criador, e jogado ao chão e submetido ‘a tremendo impacto ao chocar-se com a parede. Sentiu - se zonzo, e uma nova e pequena rachadura apareceu em sua testa.
O Criador  saiu nervosamente, e se pudesse, estaria resmungando.
Era a primeira vez que Auto saia de sua gaveta. Sua distração era tamanha, no entanto, que ele nem reparou nisto. E como se ainda estivesse lá, naquela altura enorme, da qual ele estava tão distante quanto próximo.
Ouviu um rastejar, em um lampejo instantâneo de atenção, daqueles que raramente ocorriam.
O que ele viu o assustou.
Uma espécie de lagarta mecânica, qual centopéia, faltando muitas pernas, cuja cabeça lembrava vagamente um rosto humano sem expressão. Outra das criaturas do Criador. Ela tinha , no entanto a habilidade de subir pelas paredes.
Refeito do susto, Auto arrastou-se o mais rápido que sua fraca motivação o permitia, e agarrou - se a Lagarta.
Esta permaneceu impassível, com a enigmática paciência de que só os insetos são capazes, e não esboçou reação. Apatia absoluta.
Auto foi arrastando-se por cima dela, e a olhou nos olhos.
Surpresa! O rosto dela parecia o seu próprio, tinha inclusive um olho só como ele !
Horrorizado, Auto caiu dela  ,seu olho revirou para dentro de si próprio, e mais horrorizado ainda começou a saltitar desengonçadamente com seus braços que não conseguiam firmar-se e mante - lo estável em pe.
A Lagarta só agora se mexeu, iniciando a subida pela parede diretamente ‘a sua frente.
Finalmente tranqüilizou - se. Olhou para o longuíssimo e largo corredor. De cada lado se podia ver doze gigantescas (para Auto) gavetas, uma acima da outra, no sentido vertical, e centenas, ‘a perder de vista, uma ao lado da outra, no sentido horizontal. Era apenas um das centenas e centenas de corredores entrecortados do lugar.
O que estaria por trás de tantas gavetas ? Que criaturas, certamente aos milhares, estavam misteriosamente escondidas ? Quem seriam elas ?
Isto Auto teria de descobrir.
Mas o mais temeroso, sem duvida , era procurar saber o que havia nas gavetas abertas, e muitas delas assim o estavam, revelando seus segredos.
Uma sensação estranha tomou conta de Auto. Aquele ambiente esmagadoramente opressivo, que insistia em mante - lo minúsculo diante de tamanha grandiosidade lembrou - lhe a mão do Criador. Sentiu, mesmo sem entender, sua própria pequenez. Sua casca endureceu -  se ainda mais. A cada perigo, a cada ameaça, insistia em endurecer-se rigidamente cada vez mais, qual noz, só que recebendo mais uma camada de armadura ‘a cada diminuição de si mesmo diante do mundo, e quanto mais o mundo o dominava, menor Auto ficava, mais robusto e mais robustamente alienado ele ficava.
Uma resposta ao mundo que o agredia? Talvez.
Porem, quanto menor ficava, maior era sua encapsulação em si mesmo, algo inconsciente, ou ate contra a vontade, como que para proteger seu âmago e libertar suas características típicas, seu modo vago de recusar-se ‘a ver o mundo. Auto era acima de tudo, paradoxal.
Sim, pois ele não gostava de ver ‘a si mesmo por dentro, mas era para dentro de si mesmo que refugiava-se para fugir de um mundo ameaçador e estático, cuja dureza e solidez o amedrontava ainda mais. Auto vivia entre dois mundos medonhos, vida de eterno pesadelo.
Dentro de si procurava proteção, dentro do mundo não ousava procurar nada.
Frio. O frio granito inexpressivo refletia para Auto a indiferença cruel do relacionamento inexistente entre ele e o mundo. A beleza do puro mármore brilhante refletindo qual espelho, quando um parco raio de Sol banhava o chão e as paredes, mas Auto não enxergava ‘a si mesmo. E com seu único olho, só podia ver metade do mundo. Mas as duas metades para ele significavam, indistintamente, o simples Desconhecido. Ate que se podia dizer, de certo ponto de vista, que Auto na verdade era cego!
Triste e o fato de que os dois mundos por onde Auto transitava não eram belos, não ofereciam qualquer proteção, nenhum alivio de suas dores, qualquer refugio verdadeiro, ou qualquer coisa positiva que o fosse.
Nenhum dos dois lhe dava prazer, apenas dor era o que tinham a oferecer-lhe.
Auto prosseguiu arrastando seu corpinho minguado, sempre em frente, em sua típica lentidão. Ignorava quanto tempo tinha passado arrastando-se, quando finalmente chegou ‘a um cruzamento com outro corredor. Certamente jamais tinha ido tão longe em sua vida. Desabou no chão com violência.
Começou ‘a dormir. Dormir?
Maquinas não dormem. Mas Auto era diferente. Seu maquinario interno ‘as vezes, como agora, diminuía seu ritmo de atividade, mas o diferencial e que ele, não obstante não ter cérebro, e sim, um compacto e robusto jogo de maquinas de diversos tipos interagindo entre si, tinha ainda uma modesta e precária Mente. E um pavor intenso de parar. Parar, realmente queria dizer morrer.
Aquele mundo estático para ele era um mundo morto.
Sua insegurança era ver seus “ órgãos “ , um deles que seja, parar. Sua mente confusa não parava, mas diante de tanto esforço, se acalmava.

(Por continuar) 

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